
Curitiba é reconhecida nacionalmente pelas suas vias exclusivas para ônibus e como um “modelo” em mobilidade coletiva. Mas será que ideia corresponde com a realidade?
Atualmente Curitiba possui 283,3 km de ciclovias, ciclofaixas, ciclorrotas e vias compartilhadas espalhadas pela cidade. Claro que o uso das bicicletas é ótimo para o meio ambiente, além de colaborarem para uma rápida mobilidade e bem estar físico. No entanto, ainda faltam incentivos com políticas públicas. Para o arquiteto e coordenador pela PUCPR do ClimateLabs, programa da União Européia para mitigação da mudança climática, André Turbay “O compartilhamento de bicicletas é muito legal, mas só tem na área central”, ou seja o que falta é uma logística que permita moradores de regiões mais distantes tenham, em primeiro lugar, acesso ao compartilhamento, mas também se sentirem seguros para irem e voltarem do trabalho por um preço razoável.

Além das bicicletas, outra opção de mobilidade em Curitiba são os veículos públicos coletivos. De acordo com a URBS (empresa que administra os transportes em Curitiba), em 2020 tivemos 710.589 passageiros por dia útil, em 254 linhas de ônibus, 333 estações tubos e 21 terminais. No entanto, a situação não é a ideal.
Um dos grandes desmotivadores do uso do transporte coletivo é o preço das passagens. Atualmente a população tem que gastar R$6 por passagem, a mais cara do Brasil. Se imaginarmos um trabalhador que vai e volta do trabalho durante a semana, sem pensar em passeios no final de semana, ele utilizará 10 passagens, portanto 40 por mês. Com o preço de R$6,00 irá gastar R$ 240,00 por mês, o equivalente a quase 13% do atual salário mínimo – vale lembrar que muitos trabalhadores são informais e não recebem valem transporte.
De acordo com a URBS, esse valor é relativo ao preço do diesel, gastos com lubrificantes, salário dos motoristas e cobradores, impostos trabalhistas, além de peças, manutenção da frota, limpeza dos ônibus, das estações-tubo e dos terminais e renovação da frota.
Para moradores da região metropolitana pode sair ainda mais caro. A tarifa dos ônibus metropolitanos passou de R$ 4,75 para R$ 5,50 para o cartão transporte e de R$ 5,50 para R$ 6,00 no caso da passagem cobrada em dinheiro. Para os municípios de Agudos do Sul, Piên, Mandirituba, Contenda e Quitandinha, a passagem custa R$ 7,50 para pagamento em dinheiro e R$ 6,50 para pagamento no cartão.
Vale destacar que em Curitiba existem alguns programas de descontos, como por exemplos idosos com mais de 65 anos possuem o direito da isenção. Por outro lado, os estudantes para garantirem apenas 50% de desconto devem morar a mais de 10 quadras e possuir renda familiar inferior a 03 salários mínimos, essas exigências justificam porque a URBS possui apenas 19.393 de estudantes cadastrados.
Essas condições acabam por desmotivar os jovens estudantes a usarem o transporte. Se verificarmos, por exemplo, a cidade do Porto, em Portugal, disponibiliza todos os transportes gratuitos para qualquer estudante de até 23 anos. Em nível nacional Fortaleza, por exemplo, garante duas passagens gratuitas para estudantes das redes municipais, estaduais, ensino superior, escolas privadas e cursos de línguas.

Mas podemos ir além. Em abril de 2024 a Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU) verificou que atualmente 124 cidades do Brasil possuem alguma modalidade de tarifa zero, sendo 106 (85,5%) de maneira universal (nos sete dias da semana).
No nosso estado, Carambeí, Cianorte, Clevelândia, Faxinal, Ibaiti, Ivaiporã, Matinhos, Palmas, Paranagua, Pitanga, Quatro Barras e Wenceslau Braz são as cidades com catracas 100% liberadas, ou seja, tarifa zerada para todos e em qualquer dia da semana, segundo a NTU. Na cidade de Paranaguá foi verificado um aumento de 30% nas vendas do comércio local, redução de 40% dos acidentes de trânsito e aumento da procura pelo Restaurante Popular em 200% após a implementação da Tarifa Zero.
Em relação às capitais temos algumas políticas interessantes a serem analisadas: em Belo Horizonte (MG) as tarifas são zeradas nas linhas que atendem vilas e comunidades periféricas; em Florianópolis (SC), as tarifas são zeradas no último domingo de cada mês; em São Luís (MA), trabalhadores com cartão do Programa Expresso Trabalhador não pagam passagem; em Maceió (AL) as tarifas são zeradas para todos aos domingos; e em Palmas (TO), as catracas são livres aos domingos e feriados.
É compreensível que a tarifa zero não seja uma tarefa fácil a se cumprir, afinal é provado pela NTU que ao zerar as passagens, aumenta a demanda de passageiros, uma vez que promove maior mobilidade e acessibilidade, e a consequente necessidade de aumento de frota. Das cidades com tarifa zero universal, apenas 31 possui população superior a 50 mil habitantes, porém isso não deve ser um desmotivador para Curitiba. Pelo contrário, se o foco for uma cidade mais ecológica e inclusiva, a tarifa zero faz sentido como política pública.
Para o arquiteto e coordenador pela PUCPR do ClimateLabs, programa da União Européia para mitigação da mudança climática, André Turbay, por mais que Curitiba seja conhecida pelos seus sistemas de transportes, ela é uma cidade construída para carros, o que acaba por incentivar a compra pelo transporte individual. “A faixa de renda que mais usa ônibus é até um salário mínimo, então se a pessoa tem uma pequena condição financeira, ela irá comprar um carro, porque ele sabe que terá muito mais acesso aos lugares de forma mais rápido e confortável”. As políticas de ampliação de vias dos veículos individuais e vagas para carros, encarecimento do ônibus, são posicionamentos políticos que colaboram para o maior uso do carro do que do transporte coletivo.
E os números nos mostram o mesmo caminho. Em dezembro 2023, de acordo com o Ministério dos Transportes, Paraná contabilizou 8.838.800 veículos no total, a terceira maior frota do Brasil, perdendo apenas Minas Gerais e São Paulo. Desses, 5.002.187 são apenas de automóveis. Seguido por 1.358.545 motos, 816.487 caminhonetes, 302.897 caminhões, 116.484 caminhão trator, e 50.346 ônibus.
Em Curitiba, esse cenário chama mais atenção. No final de 2023 a capital possuía uma frota de 1.737.730 veículos, sendo 1.145.033 carros. Considerando a população de 1.773.718 habitantes da última estimativa do IBGE, 64% dos curitibanos possuem pelo menos um veículo individual.
De acordo com a mesma pesquisa, Curitiba é a quinta cidade com maior quantidade de veículos, atrás de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Brasília. Segundo apuração da Band News, em 2018, São Jorge do Ivaí, no norte do Paraná, e Diamante do Sul, no oeste possuíam mais automóveis do que pessoas.
A grande quantidade de veículos individuais na cidade, além de causarem dificuldade de mobilidade com trânsitos, também acaba por afetar o meio ambiente. De acordo com levantamento da NTU, carros poluem 8x mais que ônibus.

Para o levantamento do Sistema de Estimativa de Emissões de Gases de Efeito Estufa, um serviço do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, o transporte em Curitiba é responsável por 62% dos gases do efeito estufa lançados. Desses, somente os carros de passeio, movidos a gasolina, respondem por 32% das emissões totais. Os ônibus, transporte público e caminhões são responsáveis por apenas 26%.
Ao pensarmos sobre as dificuldades ambientais de Curitiba, as ondas de calor são um fator importante. Esses gases poluentes lançados pelos veículos aumentam a quantidade de radiação solar retida e, por consequência, a temperatura do planeta.
No dia 13 de maio de 2024 a prefeitura de Curitiba juntamente com a URBS e investimento do Banco Interamericano de Desenvolvimento, lançou uma estação tudo de ônibus chamada de Estação Modelo Prisma Solar Agrárias, no bairro Cabral. A estação traz inovações como: energia solar, conforto térmico e monitoramento em tempo real. Além de ter um espaço para locação de bicicletas, Vagas para Carros de Aplicativos e Calçamento com Acessibilidade. Com orçamento de R$ 4 milhões, a estação servirá de modelo para os outros onze pontos de parada da Linha Direta Inter 2. Por mais que seja vendido como uma grande revolução ecológica, a nova estação não trouxe nenhuma significativa mudança para a questão de mobilidade urbana que ainda depende de ônibus caros, lotados e muitos vezes poluidores.
Hoje, no Brasil já temos uma grande frota de ônibus elétricos, que prometem ser menos poluidores. Movidos a partir de um sistema de recarga de bateria elétrica, a meta da prefeitura curitibana é que até 2030, 33% da frota de ônibus da capital seja zero emissões, percentual que deve alcançar 100% até 2050.
Porém o que André Turbay destaca é que os ônibus (e carros) elétricos não são a solução definitiva, uma vez que ainda é preciso gerar essa energia por algum preço. “Esse debate sobre energia elétrica é legal, mas é uma rede de transporte que já se investiu muito, mas que ela está numa área em que a população já era atendida, então não está sendo investido para buscar mais pessoas da periferia para evitar que as pessoas usem mais carro. Acho que precisam de políticas mais incisivas”, acrescenta.
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